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Quem nunca viu este Tiradentes, com ares de Cristo, figurinha carimbada na maioria dos livros didáticos?
O Tiradentes –Jesus –Cristo, herói nacional idealizado pelos republicanos, carentes de um mártir, foi inventado pelos marechais bigodudos e golpistas de 1889.
Mas quem visualizou o personagem foi o artista mineiro Alberto André Delpino (1864-1942). Nas biografias dele, há quem indique sua cidade natal como Porto das Flores, outros colocam Juiz de Fora. O fato é que Delpino, fez-se mestre fora de Minas Gerais, ao estudar com alguns mestres da sua época: Pedro Américo, Vitor Meireles, José Maria de Medeiros, Augusto Rodrigues Duarte, João Zeferino da Costa, os alemães Georg Grimm e Benno Treidler, Almeida Reis, Rodolfo Bernardelli, Bethencourt da Silva e Batista Pagani. Essa patota fazia o ambiente artístico da Academia Imperial de Belas Artes, reduto dos artistas que brilhavam nos salões que premiavam os acadêmicos com medalhas de ouro, prata ou bronze e tinham Paris como Meca.
Engraçado imaginar que a Academia protegida pelo Imperador Pedro II formou o cara que criou a imagem do herói daqueles que o tirariam do poder e desbancariam a caduca monarquia escravocrata brasileira. Cem anos antes, D. Maria I, a Louca, bisavó do Imperador, mandava “prender e arrebentar”os inconfidentes, além de enforcar e esquartejar o futuro Cristo mineiro, o bendito Alferes que nos proporciona hoje um feriado anual e denomina o colégio onde fui um aluno medíocre.
Delpino e Tiradentes se conectam com Barbacena não só pelo desenho da bandeira da cidade – ainda hei de provar que foi de Delpino a idéia de usar como símbolo, o braço esquartejado de Tiradentes – como pela cabeça do Alferes Joaquim , celebrizada nos livros de História do Brasil e que pode ter sido feita por aqui, pois nesta época ele era professor de desenho nos principais educandários da cidade.
Assim como Tiradentes, até o advento da República, Delpino tem sido martirizado pelo esquecimento em Barbacena, cidade que o acolheu por muitos anos e onde ele fez a única exposição individual de sua carreira, em 1896.
No Museu Municipal temos duas obras representativas deste grande pintor: uma minúscula tela representando a Câmara Municipal e uma grande tela retratando o Marechal Floriano Peixoto, feita possivelmente quando este veio para Barbacena em busca de ares salutares para sua doença. O retrato que ficava na Câmara Municipal foi transposto para o Museu graças à lucidez do presidente da casa na época, Professor Amarílio Andrade, que viabilizou junto aos vereadores a autorização para a transferência. Tempos depois, outro batalhador pelo Museu, Waldir Damasceno, conseguiu que a obra fosse restaurada por ele e um time de restauradores da Fundação de Arte de Ouro Preto.
Mesmo sendo considerado um mestre da pintura de cavalete, na minha opinião, a maior contribuição de Delpino para as artes mineiras está na imprensa, pois o cara era um exímio desenhista e como tal, era mais arrojado no traço do que em suas pinturas acadêmicas. Além de ter publicado em jornais como O Diabo, O Mequetrefe e o Tagarela, em Barbacena ele ilustrou vários números de O Mensal, com primorosos desenhos em bico-de-pena. Em outros posts publicarei alguns deles para deleite dos graficardíacos.
Seus desenhos emprestavam um charme às publicações que nunca mais nossa imprensa local teria igual...